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13/06/11

RAÇAS DE TRABALHO E UTILIDADE

Publicamos este mês o segundo artigo de uma trilogia sobre cães de utilidade e trabalho. No número anterior debruçámo-nos sobre os aspectos da selecção de linhas de sangue de cães de trabalho e a sua importância na consecução dos objectivos, este mês iremos abordar mais em pormenor as raças que estão mais vocacionadas para executarem aquilo a que normalmente chamamos “trabalho”.

Ainda que o ponto principal a considerar seja prioritariamente o indivíduo, uma vez estudado o conceito de linha de sangue, pudemos fazer uma incursão nas características que supostamente terão as diversas raças. A sua morfologia condiciona a componente trabalho e o adestrador deve observá-la desde a perspectiva da funcionalidade. Por exemplo: um Pastor Alemão será tanto mais bonito quando a sua morfologia se ajuste à função para que foi criado e não porque alguém considerou que uma garupa anti-natural, por exemplo, é a ideal em termos estéticos (iremos falar neste ponto no próximo artigo).

Em todas as raças podem-se encontrar indivíduos aptos para um determinado trabalho. Assim, para tarefas de rastreio, detecção de narcóticos ou explosivos serão mais úteis os cães de caça do que outros. Neste artigo vamos analisar aquelas raças que se supõem globalmente mais capazes para a realização de múltiplas tarefas, quer dizer as raças “todo o terreno” que são utilizadas regularmente na Europa e na América tanto em utilidade como em desporto. Os aspectos morfológicos do standard não serão abordados uma vez que existe numerosa bibliografia a esse respeito e só serão tomadas em conta as qualidades encontradas em indivíduos seleccionados em linhas de sangue e trabalho.

O Cão de Pastor Alemão

O rei, sem dúvida, é o Pastor Alemão considerado em todo o mundo como o cão de trabalho por excelência. O seu marcado espírito gregário, instinto de guarda, capacidade de resolução, agilidade, resistência física e versatilidade converteram-no o cão de Von Stephanitz no modelo de cão de utilidade. Actualmente é seleccionado adequadamente nos Estados Unidos e em numerosas linhas de sangue europeias de trabalho. O Pastor Alemão Checo faz referência aos criados na Checoslováquia em tempos ligada politicamente à ex URSS. Ao serem seleccionados para trabalhos militares e policiais, o nível e qualidade dos ditos indivíduos, era semelhante aos criados nas melhores linhas de sangue alemãs com a vantagem de ser mais económica a sua aquisição para os restantes países europeus. Hoje em dia é normal fazer-se referência ao Pastor Alemão Checo quando se fala de Pastores Alemães de trabalho.

O Boxer

O Boxer é a segunda raça de trabalho na Alemanha e um vivo exemplo do que ocorre quando, geográfica ou culturalmente uma raça é orientada para o trabalho ou para companhia. Em Inglaterra ou nos Estados Unidos o Boxer é um cão de companhia em que só é tido em conta o seu aspecto dissuasório carecendo de capacidade de resolução e sendo relegado para uma condição meramente estética. Pelo contrário, na Europa Central e América do Sul está muito bem valorizado pela sua atitude e aptidões para o trabalho. Orientado pelo Deutscher Boxer Klub demonstra no desporto e, especialmente em tarefas de segurança civil, as suas numerosas capacidades. Especialmente indicado para conviver no seio de uma família, é um cão rápido, inflexível na defesa e protecção do grupo, com um forte instinto de presa, facilmente moldável e que necessita de escassos cuidados de manutenção.

O Cão de Pastor Belga Malinois

Uma variedade de Pastor Belga, o Malinois, representa actualmente uma sólida raça com uma excelente presente e um futuro imparável no âmbito desportivo. Na sua aparência não incide especialmente o efeito dissuasório e, portanto, o seu uso em tarefas civis se reduz todavia ao núcleo geográfico dos países francófonos onde sim é apreciado em toda a sua magnitude. Como a maioria dos pastores, é um cão territorial e gregário, com marcado instinto de caça e protecção. Geralmente são sensíveis ainda que de rápida recuperação e bastante rápidos. Estas qualidades beneficiam-no enormemente para o trabalho desportivo mas, nas tarefas civis, é limitado o seu uso aos exemplares mais corpulentos.

O Dobermann

O Dobermann, protagonista de lendas negras e objecto de numerosas incompreensões no passado, é actualmente uma raça em expansão. O facto de nas últimas duas décadas se terem feito assinaláveis progressos nas áreas do controlo do carácter e de algumas patologias que afectam a raça, principalmente a displasia coxo-femural, sempre sob vigilância apertada do clube Alemão da raça, o Dobermann Verein, proporcionou a que os princípios básicos de uma criação voltada para a funcionalidade tenham sido adquiridos pelos criadores de referência. Este trabalho já vem sendo feito há bastante mais tempo nos Estados Unidos que se empenharam verdadeiramente na selecção do carácter e é fácil encontrar linhas de sangue de trabalho bastante evoluídas e consolidadas. As suas características mais comuns são o seu enorme apego à família e especialmente ao seu dono, o seu aspecto dissuasório, rapidez, actividade interior e exterior, desconfiança para com estranhos e excelente capacidade de aprendizagem. Por tudo isso está muito bem qualificado para o desenvolvimento de múltiplas tarefas.

O Rottweiler

Não obstante o que há muito por fazer, desde o ponto de vista oficial, para o controlo do carácter, displasia e demais pontos em que se devem basear os parâmetros básicos da criação correcta e concentrada na funcionalidade da raça, ressalta nesta a capacidade de dissuasão na defesa e a força do seu instinto básico de protecção. Em desporto têm escasso êxito devido à corpulência que o criador selecciona nesta raça e a baixa capacidade de resolução derivada de uma reduzida actividade psíquica que demonstra este cão. Podem ser dominantes na hierarquia do grupo familiar e ainda com o seu dono. Esta agressividade por competência é mais relevante nos machos que ainda não tenham alcançado os quatro anos de vida já que, a partir dessa idade, o nível e testosterona começa um lento ciclo descendente tendo como consequência a diminuição do seu grau de dominância.

Ainda que outras raças como o Airedale Terrier, Schnauzer, Bouvier de Flandres, Podengos, Cães de Água, Boieiros e um comprido etc., se destaquem numa determinada área como especialmente versáteis, a cultura do cão de trabalho integral centralizou-se especialmente nas raças mencionadas nos parágrafos anteriores.

É necessário insistir na ordem crescente de importância dos factores a analisar
quando seleccionamos ou trabalhamos com cães:

1º - O indivíduo.
2º - Linha de sangue.
3º - A raça.

No próximo número iremos falar da influência da beleza nas raças de trabalho e de utilidade.