Os
compêndios de Etologia Clínica recomendam que uma das primeiras medidas a tomar
no tratamento de algumas tipologias de agressividade é a castração dos cães.
Com este artigo vamos tentar explicar o porquê dessa recomendação, além de
outras e, fundamentalmente analisar a enorme influência do sistema endócrino no
comportamento dos cães.
O Sistema endócrino
Como
é do conhecimento comum, o sistema endócrino, é composto por várias glândulas
que segregam hormonas, sob supervisão do hipotálamo e que controla a
coordenação fisiológica do corpo. Este controlo é efectuado através da
libertação de hormonas, quando são necessárias, e contendo a sua produção
quando não o são.
As
glândulas do sistema endócrino são de segregação interna, o que quer dizer que
inundam de hormonas directamente o sangue. A corrente sanguínea transporta
essas hormonas para todos os tecidos do corpo. Como estas têm um cariz
controlador, elas não só são enviadas para todos os órgãos, como também
controlam as suas funções, mas atenção! Cada hormona, apesar de passar por
todos os órgãos, ela tem como objectivo um especificamente e só afecta esse.
As glândulas e
hormonas do sistema endócrino
A
mecânica da acção deste sistema no comportamento é a seguinte:
O
hipotálamo, que está situado na base do cérebro, envia sinais à glândula
pituitária, hipófise, que se encontra muito perto dele. Ao receber os elementos
libertados pelo hipotálamo a glândula pituitária segrega várias hormonas que
estimulam as outras glândulas endócrinas para que segreguem as suas próprias
hormonas.
Apesar
de o sistema endócrino do cão ser bastante complexo e composto por várias
glândulas, como são os casos da glândula pituitária que segrega a hormona
luteizante, ou a supra-renal que segrega a insulina, as quatro hormonas que nos
interessam e que influenciam mais directamente o comportamento canino são a
testosterona, a adrenalina, a noradrenalina e o cortisol.
Testosterona
A
testosterona é uma hormona esteroide que se produz a partir do colesterol.
Grande parte da testosterona é produzida nos testículos do macho, mas também é
sintetizada, em quantidades muito inferiores no córtex adrenal, nos ovários
femininos e na placenta.
A
testosterona pode regular certos comportamentos. Por exemplo, faz com que os
animais mantenham a concentração durante mais tempo e respondam de uma maneira
mais vigorosa aos estímulos emanados de conflito e agressividade. A
testosterona leva a que os animais se activem e respondam a uma provocação com
maior facilidade, e activam-se, e agridem-se de uma maneira mais intensa e por
um período de tempo mais longo. Está provado que os seres humanos com altos
níveis de testosterona no sangue são mais propensos a cometerem crimes, em
especial crimes violentos.
Adrenalina e
Noradrenalina
O
córtex adrenal produz várias hormonas denominadas esteroides, que regulam o
metabolismo da glicose, produzem as hormonas sexuais e mantêm os níveis
equilibrados de minerais.
Uma
dessas hormonas mais importantes é a adrenalina, também chamada epinefrina, que
interactua com o sistema nervoso simpático para ajudar o corpo a preparar-se
para situações de emergência. A adrenalina é libertada na corrente sanguínea
quando um animal se assusta (stress agudo). O coração bate mais rapidamente e o
fluxo sanguíneo altera-se desviando-se da pele e dos intestinos para os
músculos preparando-se para a luta ou para a fuga.
A
noradrenalina é responsável, entre outras coisas, pelo nível de energia de um cão.
Se a noradrenalina diminui, o corpo bloqueia o gasto de energia.
Num
cão, o estado letárgico e a depressão podem ser sintomas de inibição ou redução
de noradrenalina no sangue. O organismo só pode funcionar durante um tempo
limitado com níveis baixos de noradrenalina (stress crónico) antes de ficar
bloqueado por completo. A diminuição da noradrenalina está associada à indefesa
aprendida e à depressão.
A
presença de um alto nível de noradrenalina provocará agressividade, um estado
de alerta excessivo e inadequado, um comportamento impulsivo e uns altos níveis
de excitabilidade.
As
experiências traumáticas e o stress prolongado, levam a uma diminuição da
noradrenalina
Cortisol
O
cortisol, mais uma hormona sintetizada no córtex adrenal e que é segregado em
pequenas quantidades em ciclos naturais ao longo do dia, mas em momentos de
stress é segregado em grandes quantidades com a finalidade de preparar o animal
para enfrentar os desafios e as ameaças.
O
cortisol inibe o sistema imunológico e o processo de formação dos ossos. Inibe
igualmente a acção da insulina e facilita a transformação dos hidratos de
carbono, lípidos e proteínas para provir o corpo de mais energia para poder
confrontar-se com o agente stressante.
A
exposição ao cortisol por um breve período promove o armazenamento de
recordações, que irá ajudar o animal a recordar-se das circunstâncias que
originaram uma situação de intensidade importante. Infelizmente, estas
recordações de tipo “flash” vividas intensamente são momentos de stress extremo.
Quando um cão se sensibiliza e experimenta uma forte subida de cortisol, pode
recordar muito bem esses factos. Daí que o cortisol seja particularmente
problemático no desenvolvimento e tratamento de fobias e comportamentos
agressivos.
A
longa exposição ao cortisol tende a danificar as células do hipotálamo e, em
consequência, a prejudicar o processo de aprendizagem. Um animal que sofre de
stress crónico tem dificuldades em aprender. Isto tem implicações na hora de
tratar problemas de comportamento relacionados com o stress.
Nesse
contexto, devemos reduzir o stress para que as técnicas de modificação do
comportamento tenham influência na aprendizagem do cão.
Resumo
É
importante que o terapeuta na hora de intervir esteja de posse de todos os
conhecimentos e de todas as ferramentas que estão à sua disposição para
intervir na resolução do problema e, neste caso particular, deve ter presente
que o sistema endócrino está encarregue de controlar as substâncias químicas
que circulam no nosso corpo e têm um efeito sobre vários dos seus órgãos. O
hipotálamo, um componente do sistema límbico controla quando e o que se
segrega. Estas substâncias químicas que se libertam no sangue afectam o
comportamento. Algumas como o cortisol combatem o stress enquanto que outras
como a testosterona fazem com que os cães machos actuem como tal. A adrenalina
é a substância química que prepara o organismo para as emergências mas também
pode provocar muitos problemas.
Em
breve publicaremos um artigo sobre os dois tipos de stress, agudo e crónico, e
como eles afectam o comportamento dos cães.
Sílvio Pereira