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20/10/09

Os Instintos Básicos do Cachorro

Como desenvolver os
INSTINTOS BÁSICOS DO CACHORRO
Com vista a obter um futuro cão de Trabalho e Desporto


A solidez de carácter do cão adulto é consequência directa do adequado equilíbrio dos seus instintos naturais. A criação permite seleccionar os exemplares melhor dotados para o trabalho e para o desporto. O adestramento dá forma ao “todo”. E, neste sentido, o papel exercido pelo adestrador desde as primeiras semanas de vida é imprescindível.

Instinto Gregário


O cão, animal de matilha como o seu ancestral o Lobo, prefere viver no seio de uma comunidade. O medo atávico que o Lobo tem das pessoas foi vencido pelo cão há 16 000 anos com a sua domesticação.

O cão não considera o homem como pertencente à sua espécie, mas aceita-o no seio da sua comunidade e aprendeu a integrar-se também na humana. Esta circunstância faz com que o cão encontre facilmente o seu lugar na escala hierárquica da família humana que o acolhe e é esta a base da relação com o seu dono ou adestrador.

Mas o facto de o cão não temer os humanos tem como consequência que a conduta de os morder se encontre desinibida, em maior ou menor grau. Por esse motivo é possível que os exemplares adultos, em determinadas situações, sejam capazes de defender-se do homem ou, inclusivamente, atacá-lo.

O fenómeno baptizado por Konrad Lorenz Imprinting (anglicismo do termo alemão Prägung, e já abordado por nós em artigos anteriores), que significa impressão, tem lugar a partir da altura em que o cachorro abre os olhos e começa a ter noção do meio envolvente, nas terceira e quarta semanas de idade. Durante esta fase, diferentes estímulos e comportamentos adquirem um significado concreto que fica gravado para sempre.

É neste período que convém manipular o cachorro diariamente, pois é-lhe oferecida a oportunidade de reconhecer o homem como membro do seu grupo social. De facto, está provado cientificamente que os cachorros que, nesta idade, são pesados diariamente são mais seguros e sociáveis que aqueles que não têm tanta atenção por parte do homem. Quero com isto dizer que é obrigação do criador tratar cuidadosamente os cachorros e evitar que todas as situações desagradáveis possam deteriorar o futuro carácter do cão definitiva e irreparavelmente.

A partir da quinta semana começam a aparecer vestígios de comportamento de defesa do alimento, mas é depois da sexta semana que se evidenciam claros comportamentos agonísticos à volta do comedouro, com grande profusão de sinais: eriçamento dos pelos dorsais, rosnadelas, ladridos e autenticas lutas. Através deste tipo de condutas começa a estabelecer-se a escala hierárquica no grupo e um dos cachorros, geralmente o mais desenvolvido, começará a destacar-se dos restantes. Come primeiro, não deixa os irmãos acercar-se até que se sacie, colocará as patas sobre quem ouse disputar a sua primazia… em definitivo, converte-se num líder.

O criador não deve intervir neste processo, mas quando já estiver claramente estabelecida a dominância de um dos cachorros, chegou o momento de o separar dos outros para evitar que o seu carácter se construa à custa da deterioração do dos demais. Assim dá-se a oportunidade a outro de se converter em líder, repetindo-se assim o processo anterior até que fique só um que será o seu próprio líder.

Para a maturação do comportamento social é tão importante dominar como, em certas ocasiões, aceitar ser dominado. Uma atenta observação à ninhada oferecerá ao criador, nestas alturas, suficiente informação para que possa ter uma ideia clara das características psicológicas de cada exemplar: do carácter (capacidade de excitação), do temperamento (grau de dureza perante estímulos adversos), da inteligência adaptativa (facilidade de resolução perante situações novas), da capacidade de recuperação (facilidade de superação de situações desagradáveis), etc.

O segundo dominante é, de momento, o cachorro que demonstrou ser o melhor, pois foi dominado, recuperou-se e soube dominar os outros. O primeiro dominante só mostrou capacidade de dominar não passando pela experiência de ser dominado. Poderá ser este o melhor mas poderá dar-se o caso de não ser. Terá de demonstrar a sua capacidade de recuperação e, para isso o criador terá que intervir, submetendo-o e facilitando o seu restabelecimento.

O criador deve ser aceite como fazendo parte da comunidade. Para ele, ainda que os cachorros vivam separados, é conveniente que nalgumas ocasiões os juntem todos, mãe incluída, permanecendo debaixo da sua atenta supervisão. O criador deverá ser aceite como o elemento super-alfa. A sua experiência, sensibilidade, tolerância, doçura e firmeza permitirão que os cachorros aprendam a aceitar os diferentes estímulos, tanto positivos como negativos, com toda a naturalidade e sem inibições.

Através do jogo o cachorro aceita sem traumas a autoridade do homem. Brincar com o dono facilita a relação entre ambos, melhora a comunicação e facilita que o cão reconheça a hierarquia, que desenvolva a sua capacidade de aprendizagem e que adquira, em suma, a disposição necessária para o trabalho futuro.

Instinto Predatório

Durante todo o período de socialização (das 5 às 12 semanas), o criador deve iniciar as primeiras fases de fomento do instinto de caça, aproveitando as alturas em que se encontra reunida toda a ninhada – sem a mãe. Para evitar que os cachorros se cansem, estas sessões devem ser curtas, intensas e espaçadas no tempo.

Assim, utiliza-se um trapo velho, que servirá de presa, que devemos mover rápida, e entrecortadamente e que, rapidamente, deve afastar-se dos cachorros. Com este procedimento iremos estimular o comportamento de caça e desenvolver a conduta inata de perseguir uma peça de caça que corre e se afasta. Finalmente, permite-se que a mordam para dar por encerrado este ciclo e poder dar-lhes liberdade ao seu comportamento de presa (isto não é mais do que o que as mães lobas fazem para ensinar à sua prole as técnicas de caça).

Agora, podemos observar a capacidade expressiva da conduta persecutória, as características da mordida (tranquila ou nervosa, dura ou branda, ambiciosa ou tímida, duradoura ou breve) e o grau de possessibilidade.

Da análise do conjunto das características psicológicas dos cachorros, se obterá informação suficiente para os classificar no que diz respeito à força da sua carga instintiva e em relação ao equilíbrio entre os seus diferentes instintos. Seleccionam-se os exemplares mais aptos para o Trabalho Desportivo (RCI ou SchH, por exemplo) e estabelecem-se em cada caso a estratégia adequada onde irão assentar as bases do futuro adestramento.

Instinto de Sobrevivência


Quando o cachorro atinge as 12 / 14 semanas e já apresenta algumas sessões de trabalho relativas ao desenvolvimento do instinto de caça, pode-se aproveitar, ainda que leve e brevemente, o momento em que o acto de persegui a presa apresente a sua máxima expressão para, quase simultaneamente, permitir-lhe captura-la e assim restaurar a sua segurança e tranquilidade.

Com a apresentação de estímulos adversos de intensidade inferior ao impulso predatório, o cachorro aprende que a mordida – de escape -, tem um efeito benéfico, pois faz com que cesse a pressão. Assim, agora acede à presa através do Instinto de Sobrevivência e não, como antes, através do Instinto de Caça. O resultado é que o animal descobre que a forma de canalizar as suas inseguranças é através da mordida – mordida de escape.

Desta maneira, estabelecem-se solidamente as bases para o que no futuro será a pressão activa (pressão em direcção ao instinto).