Por ser um tema polémico - é abordado em muitas discussões e em tertúlias caninas - estes três conceitos têm-se tornado objecto de discordâncias em relação ao papel de cada um na evolução da aprendizagem do cão.
Para que, de uma vez por todas, se esclareça a importância que cada um deles têm no contexto em que se inserem, iremos de seguida ressaltar a importância de cada um.
Recorrendo-me do Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, etimologicamente Educação é a “acção de desenvolver no indivíduo, especialmente na criança ou no adolescente, as suas capacidades mentais e físicas e de lhe transmitir valores morais e normas de conduta que visam a sua integração social”. Adestramento é a “acção ou resultado de ensinar, exercitar e potencializar conceitos de formação específica”.
Para facilitar a compreensão dos três conceitos e a diferença existente entre ambos, vamos utilizar o exemplo do ser humano.
O produto final de um ser vivo é o resultado da interacção do seu potencial genético com o meio em que se desenvolve. Sendo assim, podemos chegar à conclusão que, no ser humano, como no cão ou em qualquer ser vivo, a influência genética é pouco relevante na formação da personalidade de um indivíduo. Resta-nos a envolvente social para formarmos e moldarmos o carácter de cada ser.
A criança desde que nasce, começa a ser educada segundo os padrões culturais dos seus pais, através da experiência adquirida por estes e dos valores que defendem, irão ser transmitidas aos filhos com o objectivo de torna-los nos adultos de amanhã moldados à sua imagem ou à imagem daquilo que acham ser o tipo ideal; moral e socialmente. Assim, nos primeiros anos irão ser-lhes administrados conceitos básicos que, apesar de tudo, serão muito úteis e totalmente necessários para a vivência em sociedade: o conceito de hierarquia, a coesão familiar, ensiná-los a alimentarem-se, a vestirem-se, a sua higiene pessoal, os valores da solidariedade, da amizade, da honra, etc., a maneira como aceitar e lidar com os estranhos à família e muitos outros conceitos de primeira necessidade que lhes possibilitarão enfrentar o dia a dia. Isto é educar.
A aprendizagem mais formal e com objectivos de formação mais específica é aquela que é administrada nos bancos das escolas primeiro e nos anfiteatros das Universidades depois, administrados por pessoas com formação especifica para o fazer. Ler, escrever, deduzir matematicamente, interrelacionar conceitos de história, geografia, física, química, etc., adquirir cultura geral, enfim, formar-se intelectualmente. Isto é aprender e desenvolver o intelecto.
Depois de toda esta aprendizagem e do investimento na formação, precisamos de a colocar em prática. Para isso precisamos de ganhar experiência na actividade para o qual nos formámos, precisamos de praticar com vista a melhorar as nossas performances e a tornar-mo-nos mais competentes na profissão que escolhemos. Neste caso estamos a treinar os nossos atributos com vista a exercitar, a aperfeiçoar e a melhorar os conceitos já adquiridos.
Pois, se para nós humanos, isto é tão claro, porque não o será também para os cães? Não estarão neles relacionados estes ciclos de vida à semelhança do que acontece com os nossos filhos? Não necessitam eles de se socializarem e de se hierarquizarem? Não estamos nós obrigados a ensiná-los a comer a horas e em sítios certos, a fazerem as suas necessidades nos locais apropriados, a brincar, a jogar, a interagir connosco e com os da sua espécie, em suma, a torná-los sociáveis? Isto é educar um cão.
Tudo isso está muito correcto, mas essa aprendizagem ficaria incompleta se não conseguíssemos interagir e interrelacionar com eles de uma forma completa. Para isso o cão precisa de aprender mais e neste caso é uma aprendizagem já não tão abrangente do ponto de vista social e de cuidados primários de sobrevivência, mas mais específica em termos de obediência básica e social. Para vivermos em paz e harmonia com o nosso amigo canino ele tem que saber andar ao lado do dono calma e ordenadamente, tem que se sentar e deitar ao mando do dono, tem que saber ficar quieto e calmo quando o dono vai ao café ou à padaria, tem que vir quando é chamado, etc. E aqui, vamos ter que adestrar o nosso cão nessa componente.
Como nos humanos, há alguns cães que possuem características de carácter e capacidades intrínsecas para irem mais além na sua aprendizagem e esses, se tiverem um dono que esteja disposto a com eles colaborar para melhorar as performances, podem ir mais além numa actividade ou desporto canino. Neste caso, vamos melhorar, aperfeiçoar e potencializar a aprendizagem que foi feita durante a fase do adestramento com vista a tornar o cão mais competente na área do desporto ou da actividade que escolheu e para ser cada vez melhor e mais consistente no trabalho que realiza. Neste caso, estamos a treinar o nosso cão.
Do que foi dito podemos deduzir que, e infelizmente é pratica corrente em muitas das nossas escolas de adestramento canino, adestrar um cão que não tenha as bases consolidadas da sua educação primária é a mesma coisa que colocar uma criança de sete anos a tirar uma licenciatura em Engenharia ou em Medicina.
Por fim, é importante adiantar que tudo o que foi exposto, não é o resultado de uma mera opinião do articulista mas baseado em estudos efectuados pelos mais conceituados especialistas em Comportamento Canino.
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