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10/09/10

ELIMINAÇÃO INADEQUADA

Definição

Se um cão, durante uma semana, faz as necessidades no tapete, na carpete ou no chão da cozinha ou da sala, qual poderá ser a causa deste distúrbio comportamental? Marcação territorial? Micção por submissão? Ansiedade por separação? Pode ser uma destas condutas, nenhuma ou várias. Pode ser simplesmente que o cão está a chamar a atenção porque houve alterações à rotina e o dono não passa tempo suficiente com ele. Também poderá tratar-se de uma pequena infecção urinária de que o dono não se tenha dado conta e, neste caso, um antibiótico solucionará o problema. Portanto, a solução não passa pelo clássico esfregar do focinho do cão na urina ou nas fezes para lhe “dizer” que não devia ter feito naquele local.

O que queremos dizer é que este é um problema de conduta multifactorial e que nem todos os casos obedecem às mesmas causas. Portanto, devemos analisar caso a caso individualmente e não cair em estereótipos que pela parecença e similitudes com outros casos possamos cair no erro de fazer diagnósticos errados interferindo assim no êxito do tratamento.

A eliminação inadequada é um problema maior para o dono do que para o cão. O animal tem que fazer as suas necessidades e, logicamente, o facto de as fazer num local ou noutro é um problema nosso, sobretudo por questões higiénicas e deterioração do mobiliário e portas.

Por um lado, este problema é tão importante uma vez que é um dos primeiros que levam ao abandono do animal ou provocar a sua eutanásia. Por outro, é mais fácil proceder dessa forma do que solicitar uma consulta especializada em comportamento.

Portanto, é responsabilidade do profissional fazer um diagnóstico adequado que lhe permita levar a cabo um tratamento correcto e uma monitorização exaustiva de todo o processo, com a finalidade de se assegurar do seu correcto funcionamento. Assim, se o tratamento não está a ser eficaz, estaremos a tempo de o reorientar ou reajustar.

Diagnóstico

Como dissemos anteriormente é muito importante chegar a um diagnóstico correcto, não só para um eficaz tratamento, mas também pela implicação afectiva subjacente à possibilidade de um triste final.

Para o profissional, o êxito no diagnóstico baseia-se num conhecimento o mais profundo possível da situação, incluindo visitas ao domicílio se achar necessário. Não se devem esquecer alguns factores como a existência de outros cães em casa, se o animal tem vindo a eliminar correctamente antes dos episódios, se o faz na presença ou ausência do dono ou se existem possíveis estímulos causadores de medo no animal.

Portanto, dentro do diagnóstico diferencial devemos incluir as razões médicas como primeiro motivo causal. Dentro delas devemos considerar todas as doenças que interfiram com a poliúria ou polaciúria, incluindo enfermidades do trato urinário, renal, problemas endócrinos e neurológicos. Também há que ter em conta a defecção inadequada, que ainda que menos frequente representa uma percentagem importante de eliminações inadequadas. Neste caso teríamos que considerar problemas gastrointestinais como parasitas, infecções bacterianas e víricas, alergia alimentar, corpos estranhos, obstrução intestinal, mudanças alimentares ou ambiente, mudanças na mobilidade intestinal derivadas da idade, assim como dor na coluna ou nas articulações.

Em relação às causas não orgânicas e que se supõe que sejam um problema comportamental em si, destacamos as seguintes:

Aprendizagem inadequada ou falta de aprendizagem

Considera-se que um cão não aprendeu correctamente a conduta de eliminação quando, com mais de 6 meses e ocasionalmente faz as necessidades em casa, não passou mais de um mês seguido fazendo unicamente fora e este comportamento acontece tanto na presença como na ausência do dono. Estes cães quando em cachorros não aprenderam correctamente ou podem ter desenvolvido uma preferência por um certo tipo de local inadequado. Outros cães que foram adoptados, ao levá-los ao local adequado, contrariamente ao que nós pensamos, preferem eliminar em casa.

Acesso insuficiente

Os cães que já têm um esquema adequado de eliminação podem voltar a fazê-lo em zonas indevidas por mudanças na rotina do dono ou por restrição de acesso a essas zonas. Isto é especialmente importante em cães velhos, já que não têm a mesma frequência de eliminações. Também se dá no caso de cães demasiado tímidos ou medrosos, que por ansiedade em determinados ambientes, não eliminam até que não estejam tranquilos.

Há que recordar que em casos de acesso insuficiente, o cão, por necessidade, eliminará em qualquer sítio.

Preferência por um local

A preferência por um local concreto para a eliminação começa a desenvolver-se por volta das 8-9 semanas de idade. É o momento para o ensinar a discriminar entre os locais permitidos e os proibidos. Um caso especial é ensiná-los a eliminar à ordem.

Ansiedade por separação.

É um dos sintomas que o cão pode apresentar nos transtornos relacionados com a separação de algum dos membros da família. Para que possa ser considerado como ansiedade por separação tem que se dar nas seguintes circunstâncias:

• Que a conduta de eliminação aconteça quando o dono ou algum dos membros da família não estão em casa;
• Nunca o fazem com o dono em casa;
• Sabe-se que o animal teve uma aprendizagem adequada em relação à eliminação;
• Não há nenhuma causa médica;
• As mudanças de rotina são menos importantes que a presença ou ausência do dono
• Existem outros comportamentos inadequados como destruição.

Marcação

É um comportamento facilitado social e hormonalmente. É especialmente frequente em machos inteiros.

Nas fêmeas é menos comum o comportamento de marcação através de urina, ainda que, se estão em cio efectuam padrões de urina mais frequentemente, em menores quantidades e geralmente diante de outras fêmeas e machos.

A marcação frequente com urina está relacionada com o estabelecimento da posição dentro da hierarquia do grupo. Quando um cão marca há que fazer uma análise muito detalhada de todas as interacções sociais do animal. Pode ser também um sinal de dominância, de agressividade ou de ansiedade.

A marcação com fezes é menos frequente que com urina, tanto em fêmeas como em machos.

Micção por submissão

Acontece com frequência em cachorros, fêmeas jovens e cães castigados inconsistentemente. Pode-se evitar ignorando esta conduta e premiando outras incompatíveis com a mesma. Sobretudo não se devem adoptar posturas demasiado dominantes com o animal. Sendo assim o uso do castigo é desaconselhado já que o cão, não entendendo o que queremos dele, fortalecerá a conduta e esta tende a perpetuar-se no tempo.

Há que procurar eliminar bem o odor, sobretudo em cães que não aprenderam a eliminar adequadamente, porque cheirar a sua própria urina estimula-os a fazer continuamente no mesmo local.

Micção por excitação


É frequente em cães jovens que todavia não têm controlo sobre os esfíncteres. Quanto mais excitação lhes provocamos, mais fortalecido aparecerá o problema. A urina não se evacua numa postura correcta, mas enquanto o cão anda ou salta. Há que reforçar as condutas compatíveis com a tranquilidade e a relaxação, assim como o exercício físico.

Micção por medo

Produz-se por uma contracção dos músculos da bexiga e do cólon devido ao medo extremo. Para a diferenciar da micção por submissão, esta micção e defecação deve ir acompanhada por outros sinais de medo, como taquicardia, taquipnéia (aumento da frequência respiratória), pelo eriçado, midríase (dilatação do diâmetro da pupila ocular) ou salivação.

Para eliminar este comportamento há que tratar da causa do medo, programas de alteração de conduta e medicação se for necessário.

Chamar à atenção

Acontece em cães que tentam chamar à atenção do seu dono eliminando no interior da casa, para que sejam levados para o exterior ou simplesmente para serem notados.

Incontinência de cães velhos dependente de estrogénios, ou Disfunção Cognitiva

Dá-se em fêmeas esterilizadas ou em cães de idade avançada, enquanto estão despertos ou relaxados. Não têm cabimento, aqui, as medidas de alteração de comportamento nem o castigo. Podem ser usados medicamentos que aumentem a funcionalidade do esfíncter.

• Tratamento

O tratamento deste problema de comportamento pode ser interminável e de difícil correcção se não estivermos na posse de um diagnóstico correcto e não tenhamos realizado uma análise suficientemente exaustiva do problema.

Os princípios gerais do tratamento a considerar são três:

• Eliminar a possibilidade do cão fazer as suas necessidades dentro de casa;
• Proporcionar-lhe frequentes oportunidades para a eliminação;
• Fazer da eliminação, num local adequado, algo muito agradável para o cão.

Quanto às causas médicas, supostamente o começo está em diagnosticá-las definitivamente, mediante exames complementares e tratá-las devidamente.

Se foi diagnosticada uma eliminação inadequada por falta de aprendizagem, o tratamento será canalizado para começar do zero e conseguir que o cão entenda que o local adequado para eliminar é fora de casa e a umas horas certas. Não se deve usar o castigo, sobretudo inconsequente.

Os cães velhos que sofrem de disfunção cognitiva, dores nas articulações ou incontinência dependente de estrogenios, devem-se tratar com medicação adequada. Neste caso pouco podem fazer as medidas de actuação, ainda que pode servir, em determinados cães, facilitar-lhes o acesso às zonas de eliminação tornando-as mais curtas e mais fáceis, como por exemplo não ter que subir ou descer escadas.

Nos casos de micção por submissão ou por excitação o que mais ajuda é precisamente evitar as situações nas quais o cão se sente ameaçado ou excitado, por exemplo quando nos aproximamos dele ou quando lhe colocamos a coleira. É muito difícil convencer um dono de que não se deve aproximar do seu cão ou, nalgumas ocasiões, nem olhá-lo, mas isto é parte fundamental da solução deste problema. Em casos muito específicos, ou naqueles em que o cão foi sistematicamente castigado, deve-se incluir a medicação no programa de tratamento.

O tratamento nos casos diagnosticados como ansiedade por separação, deve-se aplicar um programa específico para o tratamento desta patologia comportamental.

Por último, se se trata de marcação, devemos estabelecer programas de correcção comportamental relacionadas com a causa principal: estabelecimento de estatuto hierárquico condizente com a posição do cão no seio da matilha humana, diminuição da ansiedade por um estatuto indefinido ou castigos indiscriminados e castração ou fármacos nos casos em que se diagnostiquem como medidas úteis de tratamento.

Em resumo

Como mencionámos anteriormente, este é um problema que tem solução, mas esta passa irremediavelmente pela aplicação do dono num plano de tratamento que lhe seja sugerido.

Como o cão ainda não aprendeu a falar como efeito da domesticação – agradecemos tal ainda não ter acontecido – não podemos explicar-lhe com palavras onde queremos que faça as suas necessidades. Portanto, teremos que utilizar os princípios básicos da aprendizagem animal e sobretudo toda a paciência, muita e muita paciência. O dono não deve entrar em desespero mas ver positivamente todos os avanços, por muito pequenos que sejam, e comunicar ao terapeuta qualquer mudança não esperada no plano de tratamento, na sua rotina ou na atitude do seu cão.

O dono tem que ter em conta que tem um cão que em cachorro habituou-se a um certo local e modo de vida, e que, se decidiu adquiri-lo é porque pesou os prós e os contras. Mas também é verdade: Que aborrecido seria ter-mos um cão robot!